Tive a oportunidade, o privilégio, eu diria, de assistir há dias a um workshop sobre sustentabilidade e economia circular, promovido pela Professional Women’s Network Lisbon e conduzido por Pedro Norton de Matos, empreendedor notável, mentor e organizador do Green Fest em Portugal. Aquilo que à partida daria em mais um fórum comum sobre ecologia e consciência ambiental, nas palavras avisadas de Norton de Matos transformou-se numa reflexão entusiasta e entusiasmante sobre as preocupações que neste contexto devem estar no topo da pirâmide e as pessoas que devem estar no topo da responsabilidade: NÓS (e não eles).

Dedicámos algum tempo, é certo, a tentar responder à pergunta que um livro recomendado pelo formador levanta logo no título: Afinal quem são ‘eles’?, de BJ Gallagher e Steve Ventura. Numa extraordinária parábola, esta história de transformação leva-nos a pontos de viragem: da reação à criação, da passividade à responsabilização. À capacidade de encontrar escolhas em tudo. À prática do pensamento divergente. É a NÓS, pois, que acabámos por perceber que pode/deve sempre ser trazida a responsabilidade. Porque, afinal, NÓS podemos sempre fazer um bocadinho mais… do que eles. Lembrava-nos Norton de Matos: «Quando insistimos muito no ‘eles’, estamos a delegar neles o nosso poder. Estamos a desresponsabilizar-nos».

A sustentabilidade é, com efeito, um tema de médio/longo prazo e, como tal, deve ser encarado como um compromisso e uma preocupação intergeracionais. Não é um tema que me diga apenas respeito a mim. Vem do legado que os meus antepassados me deixaram e deve constar da herança que deixarei aos meus filhos. Certo? Por isso, na qualidade de indivíduos responsáveis e conscientes, devemos apetrechar-nos de aptidões e ferramentas para a prática de uma cidadania ativa.

Também no meio empresarial, o qual é antes de mais constituído e caracterizado pelo valor das pessoas, a sustentabilidade deve ser considerada sob uma perspetiva transversal, estrutural e temporalmente. Para responder à pergunta qual a pegada ou o impacto ambiental de cada empresa? surgem, pois, três pilares fundamentais sem os quais a resposta nunca virá completa: ambiental, económico e social. São estas as três dimensões, de resto, que devem estar integradas de forma agregada no relatório e contas de qualquer organização. O Papa Francisco, na sua encíclica alusiva à causa ecológica, Sobre o cuidado da casa comum, reforça e repropõe, precisamente, esta visão, realçando que «uma verdadeira abordagem ecológica» obriga a uma «abordagem social», decalcando alguns dos princípios dos primórdios do cristianismo.

Quando saltamos as visões isoladas do indivíduo e das organizações e olhamos para a sociedade no seu todo, pois, surge afinal de contas a dicotomia eu/NÓS. Se, ao nível do eu podemos distinguir a individualidade (atitude, não conformismo, ego domesticado) do individualismo (egocentrismo, narcisismo); ao nível do NÓS surge a questão inevitável de como passar do eu para o NÓS. Nas palavras de Norton de Matos, esta transição consiste num dos «grandes desafios civilizacionais».

Todo os dias nos deparamos com múltiplos tipos de estruturas: piramidais, matriciais, em rede, pirâmides invertidas. Ora, esta enorme diversidade de estruturas aumenta a complexificação e a exigência da nossa responsabilidade como agentes de mudança. Essa responsabilidade é tanto mais necessária quanto constatamos que vivemos numa sociedade caracterizada pelo descartável, o desperdício, o consumo. E acrescentaria: o efémero, o superficial, o inusitado. Daí outro desafio que se põe, este ao nível do desenvolvimento de competências: o de integrar vários tipos de inteligência – QI (quociente de inteligência), QE (quociente emocional), QS (quociente social) e QE (quociente ecológico). Precisaremos cada vez mais de todas elas…

Que papel podemos ter, então, nas organizações? E, para irmos ainda mais longe: que envolvimento podemos/devemos ter na comunidade? Norton de Matos terminava o belíssimo workshop com uma resposta trazida de um conto budista: «a solução está nas nossas mãos». Se começarmos pelo nosso bairro, um dia acabaremos por influenciar o mundo. Esse mundo de hoje que, de tão global, mais se parece com um condomínio.

Gandhi explicaria assim: «Temos de ser a mudança que desejamos ver no mundo». Assim seja.

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