Talvez não tenhamos olhado ainda para o azulejo a partir da sua importância cultural e do valor identitário que contém na caracterização que nos faz enquanto povo, diferenciado de todos os outros povos com azulejos. É esta perceção que nos dá com propriedade o Museu Nacional do Azulejo, que tive a oportunidade de conhecer numa visita guiada por Alexandre Pais, o seu diretor, que tem o sonho de o elevar a Património da Humanidade.

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No interior do museu, temos desde logo a dádiva da área monumental em que se insere: o antigo Mosteiro da Madre de Deus, fundado em 1509 por iniciativa da Rainha D. Leonor (1458-1525), com o epíteto de “Rainha Perfeitíssima”, um modelo de virtudes cristãs, visionária e à frente do tempo.

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Qualquer que seja o idioma predominante nas visitas ao museu, a palavra azulejo é sempre azulejo, para enfatizar uma história de 500 anos no âmbito da qual o azulejo soube reinventar-se paulatinamente. Através desta peça apenas e só aparentemente decorativa, encontramos uma chave para a interpretação do que somos. O azulejo revela a sociedade, os seus sonhos e anseios, os seus atropelos, as vitórias, posicionando-se como um ponto de observação da nossa cultura, da nossa história, da nossa identidade.

O Museu Nacional do Azulejo é, entre a panóplia de museus sob a alçada do Ministério da Cultura, aquele que mais visitas de estrangeiros regista (86%), sendo inclusive referenciado em vários pontos do mundo como aquele lugar de indispensável visita numa estada mesmo que curta em Portugal. São vários os nossos hóspedes estrangeiros que por cá estiveram parcas horas e passaram impreterivelmente por este lugar cultural obrigatório para o conhecimento do ser português.

Ao percorrermos o museu, onde vamos assistindo à evolução progressiva das várias etapas do azulejo, apercebemo-nos de que esta é a única arte que contém na sua metodologia e saber fazer os quatro elementos naturais: terra (barro), fogo (forno), ar (cor), água (tintas). E um quinto elemento, se quisermos: a sorte, o acaso ou o divino, permitindo que tudo corra bem com as fornadas. À cerâmica podemos atribuir a singularidade de, uma vez terminada a intervenção do artista, a peça não estar então finalizada. Segue para o forno e é aí que se dá a sua finalização, seu ponto de honra.

Damo-nos conta dessa plasticidade à medida que avançamos na visita. Logo percebemos que no século XVI o azulejo é experimentação; no século XVII, o que marca o azulejo português é a riqueza dos padrões (identificados mais de 1000); no século XVIII, sobressai a abordagem figurativa, narrativa, contadora de uma história; no século XIX, remete para a presença em fachadas de casas particulares, e mesmo palácios ou igrejas, como forma de poder e status quo; e no século XX para a arte pública, refletindo a estética e a identidade do artista.

Com visitas gratuitas ao domingo, este museu inclusivo e com conteúdos trabalhados tecnologicamente para todos os públicos, integra vários voluntários interessados em fazer da colaboração com o museu uma plataforma de acesso privilegiado a um dos lugares mais importantes para o entendimento do que somos. E de como somos barro. Nós, portugueses. Com essa mesmíssima capacidade de aculturação. Ou de ser com o outro. De uma curiosidade natural para tudo o que é estranho, para tudo o que é diferente. Para tudo o que é novo.

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