Rui Simões

AAo comando das operações de engenharia do Maastricht Upper Area Control (MUAC), onde é feito o controlo dos aviões que sobrevoam a Bélgica, os Países Baixos, o Luxemburgo e o noroeste da Alemanha, está um português. O único a expressar-se na língua lusa na equipa, é formado em Engenharia Aeroespacial, pelo Instituto Superior Técnico. Chama-se Rui Simões, tem 36 anos de idade e 11 de emigração. Saiu de Portugal para ir à aventura, em agosto de 2004, época em que a crise financeira não se vislumbrava ainda. Nessa altura, Rui Simões sai da TAP, onde iniciou a sua carreira profissional, com coragem para cortar o cordão umbilical com o emprego que podia durar-lhe uma vida e, mais do que isso, com a família, os amigos e o seu próprio país. O destino foi o Luxemburgo, onde integrou um curso de controlo de tráfego aéreo com a duração de três anos. Mas as expectativas foram goradas um ano e meio depois. No MUAC, que equipara à Liga dos Campeões, precisaria para a função de controlador aéreo mais “competências à Cristiano Ronaldo”. Um virar de agulha, no entanto, fê-lo integrar no MUAC o departamento de engenharia, sem o qual o controlo aéreo não evolui. Na engenharia foi sobressaindo em equipas com diferentes team leaders e, desde 2007, notabiliza-se como change manager. Rui Simões coordena a gestão de sistemas de engenharia que garante a evolução de performance do controlo de tráfego aéreo naquela zona da Europa, um ponto de confluência nevrálgico para os voos realizados entre os continentes asiático e norte-americano e uma referência na aviação mundial. As funções assumidas por Rui Simões no MUAC são um contributo inegável para a representação de Portugal fora de portas. Numa das suas vindas a Lisboa, Rui Simões ficou simpaticamente Entre Vistas para contar na primeira pessoa a sua história de emigração «à aventura», a gestão de sucessos e insucessos profissionais, o enorme cuidado e a curiosidade pelo outro e, com a distância que o tempo e o espaço lhe deram, a forma afetuosa como olha para o ser português.


Há 11 anos, saiu de Portugal rumo ao Luxemburgo. Contrariando as vagas de emigração mais recentes e, ainda antes de a crise se ter desencadeado, fê-lo por opção…

Corria o ano de 2004, provavelmente, o período mais em ebulição que me lembro de ter vivido em Portugal. No momento concreto em que fui para o Luxemburgo, estávamos a sair do Euro 2004, tínhamos ido à final, a economia estava saudável, pelo menos assim se contava a história à data, e o sentimento público, em geral, era ótimo. Havia dinheiro, havia obras públicas, os níveis de desemprego eram baixos e, portanto, nessa altura, não havia ainda uma vaga de pessoas a sair de Portugal como veio a verificar-se alguns anos mais tarde. A minha saída de Portugal deu-se, efetivamente, por opção e um pouco à aventura. Eu queria de facto era ir à aventura! Passaram-se 11 anos e, cada vez que venho de férias a Portugal, vou falando com amigos e surgem os comentários clássicos: «Olha, o João já foi!»; «O Pedro também já foi…». E a conversa clássica de quem ainda cá está é: «E não há um lugarzinho lá para mim?». Portanto, as coisas mudaram muito. Houve muita gente que saiu, há muita gente que gostava de sair e não consegue e, acredito, há também muita gente que entre dizer que vai e ir… Dar o passo é…

Difícil? Mesmo que por opção…

Apesar de ter sido por opção, nunca é fácil. Eu estava a trabalhar na TAP com a consciência de que tinha ali uma espécie de contrato para a vida e algumas regalias interessantes, como poder voar… Ainda assim, meia dúzia de meses depois, percebi que não era aquilo que queria. Ficar ali para todo o sempre à espera da minha reforma e tal… Foi com essa consciência que concorri, então, ao curso de controlo de tráfego aéreo, em Maastricht. Quando tomei essa decisão, falei com a minha família e com os meus amigos. Recebi de todos o maior ânimo e a maior força para ir. Mas o que é de notar é que eu via toda a gente a dizer «vai», com a cabeça, e a dizer «fica», com o coração. Na verdade, o que eu lia nos olhos das pessoas com quem falei foi: «Não nos deixes aqui!». Liguei para Maastricht, ensaiei uma desculpa e não fui. Pensei: «Acabou! Assunto arrumado.» E estava, de facto, tranquilo com a minha decisão (pensei, até, que fosse definitiva!). Passados uns quatro/cinco meses, estávamos no início do verão de 2004, ligaram-me de novo de Maastricht a informar que arrancaria dali a pouco tempo um novo curso de controlo de tráfego aéreo. Aí pensei: «O que faço desta vez?». Dessa vez, fiz exatamente o oposto. Não falei com ninguém, mantive-me na minha rotina, liguei para lá e disse-lhes: «Estou aí em agosto para começar».

Na hora da verdade, a decisão foi mesmo sua…

Nem mais! Mas é uma decisão muito exigente, do ponto de vista emocional…

Portugal é um país completamente uno, como não vejo por essa Europa fora…

Há tantos anos fora do país, tem com certeza o distanciamento que lhe permite olhar para os portugueses com outros olhos. Como descreve a nossa identidade?

Bem! Ainda há pouco falava com um amigo inglês, o Chris, sobre, precisamente, as características distintivas dos portugueses. Parece-me que nós – portugueses – temos coisas fabulosas: a forma como nos relacionamos, os afetos, as pequenas coisas, a senhora da mercearia onde vamos comprar um bolinho, o queijinho que vem do Alentejo, o pastel de nata, as tortas de Azeitão que a tal casinha castiça vende há anos e anos… Eu vejo este nível de proximidade em todo o país. Depois… a nossa capacidade de nos metermos num carro, em família, e fazermos 150 km só para ir almoçar àquele sítio de que tanto gostamos…

Somos um povo de afetos…

Completamente! E por diversas vezes parecemos desapegados do país, mas não somos! Somos é desprendidos dos símbolos clássicos, da bandeira e do hino. Mas ao nível dos afetos, não há nenhum português, por exemplo, do Algarve que diga não a alguma urgência do Minho, das Beiras ou Ilhas. Pelo menos, nas coisas que realmente importam. Somos todos portugueses! Portugal é um país completamente uno, como não vejo por essa Europa fora…

E o que levou de Portugal para os países onde já viveu?

Tenho esperança de ter levado o que me parece que temos de melhor, que é de facto essa proximidade de que acabo de falar. As pequenas coisas que nos valorizam e que contam as histórias que definem a nossa identidade. Saber a história da pessoa, há quanto tempo está aqui, como chegou aqui, que laços tem… Os portugueses interessam-se pelos detalhes e não apenas pelo superficial. Espero ter levado isso comigo para os países por onde tenho passado…

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É formado em Engenharia Aeroespacial. É uma área sem saída em Portugal?

Penso que a empregabilidade deste curso de licenciatura é, praticamente, de 100%. Tenho muitos colegas que já mudaram inclusive muitas vezes de trabalho, porque há diversidade de propostas nesta área. Em Portugal, estarão aí 50% das pessoas saídas deste curso. Ainda assim, parece-me que as pessoas que foram para fora fizeram-no por opção. Se todos os alunos que tiraram o meu curso no [Instituto Superior] Técnico quisessem ficar por cá, teriam com certeza saída. Estou profundamente convencido disso. Mas, atenção, esta saída quase garantida não tem apenas a ver com o curso… Deve-se em grande parte, também, à instituição Instituto Superior Técnico, cuja credibilidade e capacidade de preparação de futuros engenheiros são a toda a prova.

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Em 2005, é excluído do curso de controlo de tráfego aéreo que frequentou durante mais de um ano no MUAC. Passados 10 anos, como encara este momento da sua vida profissional? Terá sido o virar de agulha que hoje mais valoriza?   

Grosso modo, acho que sim. Mas também acho que todos os dias são feitos de potenciais virar de agulhas! Esse foi um momento de falha e de frustração. Eu saio de Portugal para fazer um curso de três anos e, passado um ano e meio, é-me dada a evidência de que comigo aquele registo não funciona.

O que é que aconteceu? Ao longo desse tempo, recebeu dados que lhe permitiram constatar que não se identificava com as funções de controlo de tráfego aéreo?

De facto, dá-se nesse momento da minha vida um insucesso. Mas, repito, a vida está cheia de insucessos profissionais e pessoais. O que é engraçado – e como já tenho alguns cabelos brancos, já posso falar com propriedade e experiência [sorriso] – é que o que define as pessoas não é se têm mais ou menos insucessos, mas a forma como reagem aos insucessos. Mais tarde ou mais cedo, todos nos confrontamos com momentos menos bons. Olhando para trás, esse insucesso foi, até, fulcral na minha carreira, porque a formação que tive durante esse ano e meio, sendo puramente operacional, acrescida da minha experiência profissional em Portugal e, ainda, da minha formação académica no [Instituto Superior] Técnico, foram ingredientes fundamentais para o profissional que hoje sou. É claro que não fui para o curso para obter apenas a formação, ia para ser controlador de tráfego aéreo. Mas, não tendo sido possível, essa formação que adquiri foi absolutamente essencial. Quando começo na engenharia, no centro em Maastricht, já vinha da sala de operações, do core business, da magia da gestão do tráfego aéreo. Neste momento, o centro onde trabalho tem 150 engenheiros e, entre eles, quase ninguém tem esse background… É como se alguém trabalhasse na gestão de um clube de futebol e, antes, tivesse estado em campo com os jogadores… Simplesmente, não foi bom para integrar a primeira equipa, teve de sair, mas adquiriu uma série de conhecimentos que lhe permitiram manter-se pelo clube…

No MUAC, em Maastricht, não há espaço para toda a gente, porque ali só se joga ao nível da Liga dos Campeões.

Quais foram as “não competências” que o deixaram de fora da “primeira equipa”?

Olhando para trás, não ter continuado foi a decisão absolutamente correta. Portanto, eu sentia que não era o [Lionel] Messi, mas também senti que não queria desistir. Portanto, ainda bem que me disseram que eu não tinha competências para aquilo. Com esta distância, até costumo dizer a brincar que é bom para a segurança de quem voa que eu não tenha sido controlador. Foi ótimo! Quanto às características… Eu compararia o controlador de tráfego aéreo a um desportista de alta competição, ou seja, a pessoa tem obrigatoriamente de manter sempre o seu nível de desempenho. Um [Cristiano] Ronaldo não pode estar três ou quatro jogos sem marcar um golo. Não será o [Cristiano] Ronaldo! Portanto, o controlador de tráfego aéreo tem de estar – sempre – num nível altíssimo. E eu não tinha, de todo, essa capacidade. Eu era capaz, certamente, de marcar um golo à Ronaldo, mas também era capaz de dar dois ou três passos falhados de seguida. E, naquela profissão, a pessoa não pode estar abaixo de um certo nível, ponto final. E, como eu não tenho essa constância, aquilo não era para mim.

O controlador de tráfego aéreo está em permanente gestão de crise?

Essa pergunta teria melhor resposta se feita a um controlador de tráfego aéreo! Eu diria que está em permanente estado de alerta. Maastricht – já falei aqui de futebol – é como se fosse a Liga dos Campeões! Nos variadíssimos centros espalhados pelo mundo, há espaço para toda a gente, a jogar em todas as divisões. No MUAC, em Maastricht, não há espaço para toda a gente, porque ali só se joga ao nível da Liga dos Campeões.

Trabalha desde 2007 na área de change management. O que faz um change manager?

O que costumo dizer é que, normalmente, não faço nada! Ou seja, o que faço é garantir e assegurar que quem faz, faz de maneira coordenada, por forma a serem atingidos os objetivos definidos. No fundo, é uma função de coordenação, baseada no contacto humano, cara a cara,  por telefone e e-mail. Partimos de um plano, com diferentes horizontes temporais e, tendo em conta os recursos humanos existentes, tentamos simplesmente executá-lo com a esperança de atingirmos os benefícios projetados.

O que faz então a equipa que coordena?

Outra pergunta curiosa… Eu não tenho propriamente uma equipa. Limito-me a coordenar, com os chefes de projeto, os diferentes chefes e membros de equipa e o pessoal operacional, os verdadeiros clientes do meu trabalho. O objetivo passa por garantir que todos os sistemas funcionam do ponto de vista informático e de engenharia com correção, segurança e a qualidade necessária para a função de gestão de tráfego aéreo. Fisicamente, estamos a falar de um centro – sempre em funcionamento – com muitos, muitos computadores todos ligados uns aos outros, com as mais variadas funções, de processamento de dados de radar, de dados de voo, de voz, de comunicação com os aviões, etc. São vários equipamentos a desempenhar cada um deles a sua função, como cada órgão no corpo humano. E estamos a falar de um sistema não estático. Aquele que está hoje implementado não é igual àquele que estava lá há um ano, nem esse era igual ao anterior. Nem sequer é igual àquele que estava no ar há uma semana. Está em permanente evolução. Portanto, o meu trabalho passa pela coordenação do trabalho de todas as pessoas que estão por trás destas máquinas, com vista a fazer evoluir o sistema, com correção e segurança.

Podemos dizer que se trata de uma área de retaguarda do controlador de tráfego aéreo?

Prefiro recorrer a outra analogia: o controlador aéreo é um piloto de fórmula 1 e o sistema é o carro, eventualmente um Ferrari. Na área de change management, tenho de contribuir constantemente para que o Ferrari evolua… A corrida pode ser ganha independentemente do meu trabalho, numa perspetiva tática e imediata. Mas, a longo prazo, se o carro não evoluir, as corridas ficarão comprometidas. O meu trabalho tem a ver, por isso, com a evolução estratégica do sistema de engenharia, nomeadamente, ao nível informático, de hardware e software.

Partes básicas do sistema de engenharia:

sistemas de telefonia e radiofonia que permitem falar com os pilotos e os centros de controlo vizinhos;

sistemas de radar que permitem “ver” os aviões no ecrã de controlo;

sistemas de processamento de dados que permitem visualizar, para cada  target no radar, dados sobre os voos e suas intenções (tipo de avião, companhia aérea, origem, destino, rota pretendida, etc.).

Como é que a sua formação o preparou para as funções que hoje desempenha, ao lado dos seus pares de outras nacionalidades?

Sempre me senti bem preparado. No entanto, penso que a melhor preparação é ter vontade de aprender, disponibilidade e humildade para perguntar, assumir sempre o que se sabe e, acima de tudo, o que não se sabe. Agora, esta atitude tem a ver com a maneira de estar, com a cultura e a formação de cada um. No limite, tem a ver com a confiança que a pessoa sente em si mesma. Uma pessoa menos segura, e quiçá menos experiente, não tem a capacidade de dizer, declaradamente, que não percebeu e que precisa que lhe expliquem melhor… Mas o poder de dizer «não sei, não faço ideia, podes ajudar-me?» é extraordinário… E é de facto uma coisa a que eu recorro sistematicamente. Onde a pessoa, no fundo, deve chegar é à sensação de que não há nada que não possa aprender… É necessário é a pessoa aplicar-se, ter capacidade de trabalho e vontade. Existe algo de mágico em interpelar a pessoa mais simples e pedir-lhe ajuda: «Importa-se de me ajudar. Não percebo nada disto…». E, a partir daí, estabelece-se uma relação! Ora, uma pessoa que faz isto, diariamente, em qualquer área, está a desenvolver um conhecimento sobre tudo e mais alguma coisa. Isto é absolutamente precioso! Mas, lá está, é preciso é ter a curiosidade para com o outro… Voltando à preparação dada pelo curso… Em termos técnicos, sempre me senti muito bem preparado. Mas a preparação para a vida profissional vai muito além disso…

Bem, um bom curso, na verdade, o que ensina é a saber pensar…

Exatamente! Nem mais. Saber pensar, saber perguntar (na maior parte das vezes a nós mesmos), saber procurar, saber onde procurar…

Era esta a carreira profissional pela qual optaria quando era “pequenino”?

Não [gargalhada]! Quer dizer, não sei! A minha mãe diz que eu dizia que queria ser bombeiro! E eu, tenho a certeza, queria era jogar à bola. Mas, numa fase mais avançada, provavelmente lá para os meus 16/17 anos, tinha já a consciência de que a minha forma de pensar era técnica, o que deixava adivinhar muita coisa já. Aquilo redundaria, certamente, numa engenharia, embora não soubesse na altura qual.

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A sua primeira experiência profissional foi ainda dentro de portas, na TAP, na área de engenharia de operações (entre 2003 e 2004). Como olha para a TAP de hoje, com tantas transformações em curso?

A forma como olho para a TAP de sempre (não apenas para a de hoje) é dual. Porquê? Eu trabalhei na TAP e tenho, ainda hoje, vários amigos a trabalhar na TAP, em diferentes áreas. Alguns deles são inclusive amigos que conservo desde o tempo do curso universitário. Vemo-nos quando venho a Lisboa. Tenho, por isso, um grande carinho pela TAP e por amigos que ainda hoje lá trabalham. Agora, a verdade é que eu sou há 11 anos emigrante e, como tal, tenho necessidade de vir a Portugal para estar com a família e os amigos. Tenho, por isso, uma visão sentimental forte, mas consigo ao mesmo tempo ter uma visão fria de quem precisa da companhia para se deslocar na qualidade de emigrante. Separando as águas, começo por esta última faceta, a de emigrante.

Durante muitos anos, vim a Lisboa, mas via Porto ou até Faro, através da Ryanair. É que os bilhetes eram incomparavelmente mais baratos. E, parece-me que isso é indiscutível, o preço é uma coisa absolutamente fundamental. Sobretudo, porque temos uma vaga de jovens emigrantes que não tem forçosamente a capacidade de voar numa companhia de média ou alta gama. Lembro-me de chegar ao Luxemburgo e de falar com uma pessoa que não vinha a Portugal há uns 20 anos e não seria propriamente por não querer… De certa forma, olho para a TAP e os nossos governos como um entrave à entrada das low costs mais cedo, o que, na verdade, só vem a acontecer em força no Aeroporto de Lisboa muito recentemente. E isto, posso confirmá-lo, foi um marco muito celebrado por todos os emigrantes que vêm com frequência a Lisboa. De repente, passámos a ter a possibilidade de vir aqui muito regularmente. Pelo menos, passaram a existir ofertas à medida das diferentes carteiras. Para mim, esse momento foi fundamental, embora tristemente me pareça que decorreu sem alternativas e num cenário de crise nacional. Ora, a decisão de trazer as companhias low costs foi bastante tardia e isso prejudicou não só emigrantes, como eu, mas também os turistas que entretanto vemos de há uns tempos para cá, às centenas, em cada esquina de Lisboa. Neste momento, temos o número de visitantes na nossa capital a crescer a dois dígitos por ano. Portanto, esse potencial sempre cá esteve, mas não tinha sido ainda explorado.

Voltando à TAP… É claro que a TAP terá sido uma das grandes beneficiadas deste atraso na entrada das low-costs. O facto de tanto a TAP como a ANA terem estado todo este tempo sob a égide do Estado terá sido fundamental para a manutenção desse status quo que em nada beneficiou os nossos emigrantes e a nossa indústria do turismo. Dito isto, a minha esperança e o meu desejo profundo são no sentido de que a TAP encontre novas energias para dar a volta a uma situação difícil e de enorme concorrência. Que a TAP veja nesta conjuntura, não um problema, mas um desafio que a possa catapultar para uma nova e vibrante fase da sua longa existência.

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Um dos seus lemas de vida é ir (na perspetiva da viagem), porque considera que é isso que nos traz à terra e ao que realmente somos… É com este sentimento que parte sempre que viaja?  

Sim… Mas… Penso que o sentimento mais forte que levo comigo quando vou de viagem é a vontade de conhecer o outro. Mas, claro, ao conhecer o outro reconheço-me a mim mesmo. Eu só ganho verdadeira consciência sobre as características típicas dos portugueses de que falávamos há pouco quando conheço outros povos, outras culturas e, através deles, das suas diferenças e paralelismos, me coloco em perspetiva. Daí que me pareça que o mais importante quando vamos de viagem seja a predisposição para conhecer o outro. O reconhecimento de nós próprios não é em si um objetivo, mas uma consequência.

Qual foi o lugar mais longínquo aonde o avião já o levou?

Provavelmente, à Califórnia!

Em Maastricht, onde reside, encontra-se numa confluência de países europeus (Holanda, Alemanha, Bélgica e Luxemburgo)… É um privilégio?

É! Se conduzir um pouco mais, então, tenho também a França à mão de semear! Essa confluência de culturas é extraordinária… E na própria cidade de Maastricht, em plena rua, ouço as línguas todas. É uma verdadeira sopa de culturas! É engraçado que esta tendência, então nesta zona da Europa, em particular, tem vindo a acentuar-se. É uma torre de babel em efervescência.

É um adepto de variadíssimas modalidades de desporto, tem diferentes interesses culturais e artísticos, é um leitor regular… Nestas facetas, estamos a falar menos do engenheiro e mais do Rui Simões?

Um não se dissocia do outro!

É que, por vezes, predomina o preconceito de que o engenheiro é muito frio, muito racional, muito lógico… Mas o Rui Simões tem variadíssimos outros interesses…

Acho engraçada essa ideia do preconceito! Talvez a razão pela qual ele ainda predomina tem a ver com as pessoas em si. É de facto comum as pessoas muito técnicas desenvolverem essas características. E eu, atenção, não me sito com a preparação de quem estudou ciências sociais e humanas, mas desenvolvi seguramente outras competências. Voltamos à mesma ideia: o meu interesse pelo outro, o qual me pode levar em qualquer direção. Posso sentar-me com um futebolista, um escritor, um engenheiro, um chef de cozinha e, naturalmente, conversarei com qualquer um, porque é genuíno o meu interesse e a minha curiosidade pela pessoa em si.

É um curioso…

Sou um curioso nato!

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2014 ficou marcado por acidentes graves na história da aviação. Que olhar tem sobre esta matéria quem trabalha no backstage da aviação?

O meu olhar é frio… Se calhar posso dececionar quem me estiver a ler! Mas a verdade é que os dados estatísticos que existem sobre a área da aviação dizem que é cada vez mais seguro voar. À medida que o tempo vai passando, a probabilidade de apanharmos um avião e algo correr mal é menor, cada vez mais ínfima. E isto é factual, tem a ver com o número de aviões que há no ar por ano e a quantidade de incidentes e acidentes verificados. Agora… não me parece que esta informação seja sedutora do ponto de vista mediático! Falar do avião que se despenhou, especular sobre as possíveis causas é mais interessante do ponto de vista dos meios de comunicação social. É claro que por detrás de cada acidente há um conjunto de famílias e uma dor imensa. É claro que um acidente de avião pressupõe, quase seguramente, uma fatalidade. E estes aspetos causam uma sensação enorme de impotência. Mas há também, claramente, um efeito de media que me parece que distorce a perceção em relação à aviação e que não ajuda a, racionalmente, fazer passar a mensagem de que viajar de avião é cada vez mais seguro.

Gostava de pilotar um avião?

Já o fiz, quando estive na TAP, ao comando de um simulador do A320. Mas a experiência não foi a melhor [gargalhada]!… Saí-me melhor a pilotar aviões telecomandados! Mesmo aí o desfecho final não foi o ideal para o avião…

Fora do avião, é change manager. Que função/papel escolheria dentro do avião?

Escolheria ser passageiro, para ir em viagem!…


+ Informação Eurocontrol

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