A recomendação desta leitura chegou-me numa homilia do Padre Vítor Feytor Pinto, já aqui entrevistado e cujas palavras sempre são um detonador para uma ação concreta e decisiva (mesmo que aparentemente discreta e até rotineira). Não hesitei em procurar então o livro Papa Francisco A Revolução Imparável, dos jornalistas António Marujo e Joaquim Franco, ambos especialistas em temas religiosos e que nesta publicação tão bem elencam as linhas mestras da visão do protagonista. Foi neste verão que tive oportunidade de o ler e desde aí que reflito na magnitude, diversidade e profundidade do pensamento do Papa Francisco. De tão abrangente que é, surge como um chapéu largo, muito largo, para todas as vertentes da nossa vida. Individual, familiar, organizacional, societária, comunitária…

O livro arranca com uma pergunta. «Ainda se poderá dizer alguma coisa de novo sobre o Papa Francisco?» A resposta é dada a cada palavra, linha, página. Ao longo de todo o livro, vamos descobrindo como o Papa Francisco é a concretização – todos os dias nova – de um conjunto de expectativas que estão hoje imbuídas neste mundo tão periclitante e sanguinário. Vamos descobrindo, afinal, como o Papa Francisco é ele próprio a concretização da nossa esperança. Seguramente, para crentes e não crentes. E neste ser esperança sobressai uma abordagem de revolução e desassossego e, simultaneamente, de escuta e reflexão. «Na era da velocidade, o Papa Francisco exprime uma proposta revolucionária que vai aos alicerces do Evangelho e aponta para a descoberta do concreto, dos afetos (…)». Evoca a recuperação de palavras como «com licença», «obrigado», «desculpa».

É também desconcertante na sua caracterização do poder e da hierarquia, porque «sempre recusou ver-se como um chefe a quem todos devem obediência, preferindo insistir na ideia de que o verdadeiro poder é o serviço». Por isso exerce a função de Papa como se de um pároco se tratasse, com o mesmo sentido de serviço, proximidade e atenção ao outro. É de uma assertividade fatal quando lembra que vivemos no tempo de regressar ao essencial: «(…) a grande revolução é ir às raízes, reconhecê-las e ver o que essas raízes têm a dizer no dia de hoje». Diz: «Nunca posso dar um passo na vida se não partir de trás (…)».

Os autores do livro vão percorrendo, pois, as ideias charneira do pensamento do Papa Francisco, com enfoque em alguns dos pontos mais sensíveis e com opiniões díspares geradas. O seu discurso vem recentrar, por exemplo, a importância do papel das mulheres: «O génio feminino é necessário nos lugares em que se tomam as decisões importantes». E vai ainda mais longe: «as mulheres foram muito mais importantes entre os primeiros seguidores de Jesus do que se pensava e tiveram mesmo um papel de liderança nas comunidades fundadas por São Paulo».

Mas quem o Papa Francisco efetivamente coloca no centro são… as pessoas. Surge este argumento como uma desaprovação direta à «economia que mata». «A medida de grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como trata os mais marginalizados». Avança o Papa. É também um dos seus temas principais «o cuidado da casa comum», na apologia da questão ecológica e de uma disposição de cuidador versus explorador. Lembra-nos que «vestir os nus tem hoje uma dimensão mais profunda: implica, por exemplo, uma atitude que evita o culto do luxo, do supérfluo desnecessário». Mas recorda: «aliviar a dor é tão importante como alimentar a esperança». É também focada a misericórdia, claro, na medida em que ela «não é fazer um bem “de passagem”, significa compromisso onde está o mal, onde há doença, onde há fome, onde há tanta exploração humana».

Recupera, não raras vezes, num apelo direto à consciência de cada um, uma preocupação que devemos trazer connosco: «Que mundo queremos deixar aos nossos filhos?». Fala-nos da conjuntura que atravessamos como uma «guerra mundial aos bocados». Daí ser ainda mais crítica esta pergunta que devemos colocar-nos. Mas são o «sorriso», a «alegria» e a «gargalhada espontânea» as marcas do pontificado deste Papa que nos «propõe uma leitura cristã dos sinais deste tempo». Deste Papa que hoje faz 81 anos e que há mais de 25 não vê televisão.

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