Assistimos, neste livro, e quando damos por nós somos parte de uma «viagem pela literatura universal». Porventura, à procura do amor. Do sexo? Ou não. Ou de uma suspeita de que entre os dois e o mundo, entre os três, a relação é triangular e imperfeita. Não me esquecerei que comecei a lê-lo à saída da segunda vacina contra a COVID-19 e numa espécie de convalescença entrei na leitura boquiaberta, pela diferença do estilo, do tom e do conceito de escrita. Incrível este autor, premiado já em vários dos seus títulos, pela originalidade, a abordagem, o território e a amplitude culturais.

A rede em que José Gardeazabal suporta este livro é a sua cultura literária. E eis que a partir da página 43, sempre a 43, de 36 grandes obras, segue desenvolvendo o seu próprio romance. Este Quarenta e Três, lá está.

«Lemos muitas vezes no prefácio de um livro a frase “este livro é sobre”, e depois vem o livro, como se existisse a realidade, que é o que é, e existissem os livros, que são sobre a realidade. Não é assim. Os livros, pelo menos, não são assim». Lemos no prefácio. Surgem com este livro a literatura, os livros e os mapas para interpretarmos (ou traduzirmos) as obras de que o autor parte. E fundimo-nos depois num diálogo, ora labiríntico, ora comum e pacífico, dependendo do que levamos de trás de conhecimento sobre as obras e a edição que delas possamos ter. Já que a página 43 diverge de edição para edição, claro.

Surgem à frente dos nossos olhos bibliotecas aos molhos, referências, títulos e cenários da literatura universal, de Beckett a Calvino, de Lispector a Roth, até Pétruchévskaia. E entre os ruídos de uma voz invisível, vamos entrando – o truque passa mesmo por entra e estar lá – num jogo literário que nos transporta no tempo, à medida que avançamos no espaço das páginas, destas em concreto neste Quarenta e Três que nos lembra a Humanidade (inteira). Como na literatura que é literatura.

E no fim do livro temos justamente isso: o fim. Com um desenho que resume a narrativa. E uma série de ideias que ficam no balanço da leitura. «O sexo pode ser o amor a velocidades alucinantes (…)». O amor. Essa «tortura para os homens». E eis que nos damos conta das frases contidas na literatura russa: «E depois as coisas pioraram ainda mais».

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