2020 é o Ano Internacional do Som, num tributo ao papel adquirido pelo som nas nossas vidas. De acordo com a UNESCO, o som «influencia o equilíbrio dos seres humanos e tem dimensões económicas, ambientais, sociais, médicas, industriais e culturais». Pela sua relevância, será alvo e protagonizará ao longo deste ano iniciativas locais e globais um pouco por todo o mundo. E a partir do som, ocorreu-me o silêncio. E ocorreu-me a voz, essa ferramenta tão crítica naquilo que dizemos (e não dizemos), no tom que assumimos (e omitimos), nas pausas que fazemos (ou evitamos fazer) para dizer o que queremos (ou que queríamos ter dito).

A voz é um canal da linguagem, por excelência. Pode ser alta, pode ser baixa, grave, aguda. Pode entrar pelo ouvido ou esbarrar-se e fazer ricochete. Pode encantar, desencantar, ficar na memória ou cair no esquecimento. Agradar e aproximar. Desagradar e afastar. A voz é um veículo de transmissão de mensagens e, por ter essa capacidade de juntar ou separar, ser ou não ser, é uma ferramenta de comunicação tão relevante.

Na minha formação escolar e académica, foram vários os fóruns em que a voz foi requisito fundamental para fazer a diferença. Num ateliê de rádio, aperfeiçoei a técnica e o procedimento para colocar a voz à medida. Mais tarde, já em contexto profissional, tive oportunidade de me familiarizar com o registo de televisão e aprender que, ao unir as palavras ditas à imagem, surge um desafio ainda maior e mais rico. Em formações de locução, conduzidas por profissionais de locução e atores, ajustei a voz aos diferentes registos que a mesma pode ganhar, quando aplicada ao jornalismo, à publicidade, à declamação de poesia…

Mas ainda antes de ter descoberto o valor da voz, tinha aliás acabado de aprender a ler e, quase naturalmente, influenciada pela professora primária, ganhei o hábito de ler em voz alta todos os textos que me apareciam pela frente. À medida que fui crescendo e interiorizando o sentido e a perceção sobre a voz, fui ganhando o gosto pela colocação da voz, pelas palavras lidas. As palavras ditas. E a forma que ganham ao gerarem som.

Ao longo do tempo, tenho trabalhado e ampliado a plasticidade da voz em vários projetos de locução e, mesmo quando conto uma história aos meus filhos, não me abstraio do tom do som com que lhes leio. Acho, aliás, que nunca me abstraio do som, nem mesmo do som de um segredo, dito ao ouvido. Até do som do silêncio, quando finge não dizer nada.

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