Estamos perante um livro de memórias neste Ficheiros Secretos, de Luís Osório, escritor e jornalista. Combina o tom literário com a escrita jornalística. Promove uma contaminação positiva entre a realidade e a ficção. Colige histórias da História, com o olhar apurado do Luís (permitam-me tratá-lo aqui como o trato sempre), que teve o privilégio de se cruzar com as principais figuras que fizeram os factos recentes do país e que lhe contaram ao ouvido, elas próprias, as suas histórias aqui retratadas.

Assistimos ao referenciar de nomes, como Álvaro Cunhal, Mário Soares, Maria Barroso, Frei Bento Domingues, Jorge Sampaio, Ramalho Eanes, Francisco Pinto Balsemão, Francisco Lucas Pires, Pacheco Pereira, Bagão Félix, José Miguel Júdice, Amália Rodrigues, Eduardo Lourenço ou Vasco Pulido Valente. Somos levados para o início de novos ciclos, movimentos, partidos políticos. Somos postos na memória do poder e dos poderes, do antigo regime, da «frágil sociedade civil», da «incerteza do futuro». Somos levados a imaginar figuras de peso com adjetivos contundentes, retratos viscerais: «intratável, arrogante e caprichoso». Ouvimos mencionar literatura e correntes, caso dos «existencialistas como Camus e Sartre».

E entre as diferentes histórias, vamos encontrando frases prodigiosas do autor: «(…) o que faz tocar o céu ou o inferno não se aprende. Simplesmente acontece, como um milagre terreno ou celeste». Do autor que acredita que há razões para os altos e para os baixos: «(…) ninguém aguenta uma caminhada no deserto sem uma utopia». Aqui, o Luís procura os homens com «a capacidade de manter a independência de espírito nas condições mais difíceis». Relata os que venceram e os que falharam.

E nas entrelinhas das histórias, encontramos implícitas questões que nos colocamos legitimamente sobre a vida dos outros para melhor esclarecermos a nossa. «Porque o destino, por mais voltas e revoltas que dermos, vem-nos sempre tocar». E quando estamos profundamente seguros de que o caminho é este ou aquele, eis que estremecemos: «Acontece-nos a todos – num repente, como se a vida já estivesse escrita, um acontecimento ou uma pessoa baralha-nos as certezas».

«Viver talvez seja mesmo um exercício entre a realidade e a ficção – o que somos no presente, o que escolhemos do que fomos e o que mais desejamos do que poderemos ser», sintetiza o Luís num importante esclarecimento sobre a abordagem assumida no seu livro, nesse registo combinado entre o real e o ficcional que todos somos.

Aqui, em resumo, lemos as histórias de que o Luís não se esqueceu.

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