«Num mundo caótico, adquirir livros é um ato de equilíbrio à beira do abismo». Este livro situa-nos no significado do verbo ler. É um tratado sobre a leitura, desde a Antiguidade. E sobre o livro enquanto laboratório de mudança. Num método de investigação académico e jornalístico, assente na viagem, na observação e na pergunta, a espanhola Irene Vallejo abre a Caixa de Pandora dos livros. Depois desta leitura, a nossa experiência de ler é radicalmente diferente.

Irene Vallejo começa na Grande Biblioteca de Alexandria, posicionada como um sonho perseguido de reunir todos os autores desde o início dos tempos, até à biblioteca paradisíaca de Jorge Luis Borges, que «também estava enfeitiçado pela ideia de abraçar a totalidade dos livros». A partir deste retrato longínquo, a autora leva-nos pela mão num caminho de dúvidas, perguntas, mais do que respostas. Coloca-nos nos olhos o ver das primeiras vezes. Vamos nesta leitura à Grécia que inventou o futuro, com todas as suas instituições, centros de investigação e ofícios de pensar. Criamos na nossa imaginação os antepassados dos livros que hoje conhecemos: as tabuinhas de argila, os rolos de papiro, o pergaminho… e passamos pelos grandes poemas épicos, como a Ilíada, o livro mais lido na Antiguidade, mas também pelos livros de cozinha. Todos os autores incontornáveis da oralidade – de Sócrates, a Pitágoras, de Buda a Jesus – são passados a pente fino.

Vamos à Roma Antiga, que deu à globalização uma intensidade nunca vista do lado helenístico. Do seu contributo para a participação na vida da cidade através dos livros e dos bustos literários orgulhosamente exibidos. Mas, ainda, no lado romano, da história da escravatura, porque aí os livros estão impreterivelmente relacionados com os escravos. E do pendor mais privado da leitura, afastada também das mulheres, que naquela época não se queriam propriamente cultas…

Este livro foca-se também no alfabeto como a invenção tecnológica mais profunda e relevante de sempre. Mais profunda e revolucionária do que a Internet, dado ter contribuído pela primeira vez no mundo para a construção de uma memória comum. E porque foi paulatinamente saindo da esfera nobre e aristocrata, dando origem à escola e à «esperança de transformar o mundo», que tem sempre razão. E, claro, este livro fala de Guntenberg.

Irene Vallejo identifica os livros imprescindíveis ao longo dos tempos, num exercício que parece tornar mais palpável o infinito. Apalpa um a um os clássicos que, pela sua natureza de clássicos, retêm «um significado para as épocas vindouras». E a resposta à pergunta eternamente colocada: quem sou eu? «Porque só entenderemos a nossa identidade se a compararmos com outras identidades. É o outro quem me conta a minha história, quem me diz quem sou eu». E, nesta inquietude, percebemos melhor a autora, que nos diz haver «muito mais pedagogia na inquietação do que no alívio».

O que Irene Vallejo nos dá neste livro, para além de um tratado do livro e da leitura, é um sinal de enorme afeto, já que «recomendar e entregar a outro uma leitura escolhida é um poderoso gesto de aproximação, de comunicação, de intimidade». E O Infinito num Junco é isso e muito mais. Aloja por assim dizer das melhores ideias alguma vez fabricadas pela espécie humana.

.

error: Content is protected !!